A Justiça de Goiás levou em consideração a paternidade socioafetiva entre as partes ao manter o registro de uma menina pelo pai não biológico. Também foi mantida a obrigação alimentar do autor da ação, que havia requerido a desconstituição da paternidade após descobrir ausência de vínculo consanguíneo. A decisão é da 1ª Vara de Família e Sucessões da Comarca de Aparecida de Goiânia, no interior do estado.
Em ação negatória de paternidade com anulação de registro civil e exoneração de alimentos, o homem sustentou que registrou espontaneamente a criança acreditando ser seu pai biológico. Após desconfiar da paternidade, realizou exame de DNA, e o resultado culminou na sua separação da mãe da menina. Ele também alegou que, desde então, não teve mais contato com a infante.
O juiz responsável pelo caso observou que o registro da paternidade somente pode ser desconstituído com comprovação de erro, coação ou falsidade que viciem a vontade do pai registral, não podendo, por mera liberdade, ser desconstituída. Para ele, não basta a comprovação de inexistência de vínculo biológico ou mesmo o arrependimento posterior, se for constatada a socioafetividade, como no caso.
Segundo o magistrado, os autos evidenciam a existência de vínculo socioafetivo, conforme disciplina o artigo 1.593 do Código Civil. O relacionamento parental estabelecido entre o pai registral e a menina é privilegiado em detrimento do vínculo biológico, sendo esse o entendimento da jurisprudência e doutrina. “É dizer, havendo o vínculo socioafetivo, o biológico é de somenos importância”, pontuou.
Vínculo nunca foi interrompido
O relatório técnico da equipe interprofissional, não impugnado pelo autor da ação, constatou que ele nunca deixou de ter contato com a filha, até mesmo após ter proposto a ação. Manteve genuíno relacionamento com ela, havendo afeto entre ambos até os dias atuais. Sua intenção, por outro lado, era a de ajudar espontaneamente, sem obrigação e sem perder o vínculo de afeto já estabelecido.
Para o juiz, a pretensão do autor era de somente se desvencilhar da obrigação de alimentar, sem encerrar a convivência paternal. “Assim, em um mundo de relações afetivas cada vez mais efêmeras e com aspecto de descartabilidade, cabe ao Judiciário amparar os interesses dos incapazes, preservando sua dignidade e seu direito personalíssimo à filiação”, ponderou o magistrado.
“Desta forma, considerando que restou comprovado o convívio da menor com o autor por um considerado lapso temporal, e que este trata a requerida como se fosse sua filha perante a sociedade, há de se reconhecer a existência de vínculo socioafetivo entre as partes, que deve ser amparado juridicamente, com a manutenção da obrigação alimentar constituída em favor da menor, mantendo inalterado seu registro de nascimento”, concluiu o juiz.
Decisão: 25/05/2021