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Maioridade civil não desconstitui, por si só, obrigação alimentar, diz STJ

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) negou, recentemente, habeas corpus a um pai que não pagou pensão para a filha, alegando que ela é maior de idade. No entendimento da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), já consolidado na jurisprudência, a maioridade civil, por si só, não é capaz de desconstituir a obrigação alimentar.

No caso, quando houve o divórcio entre os pais, foi homologado acordo que reduziu o valor da pensão que o pai deveria pagar aos filhos. Um tempo depois, a filha mais velha entrou com execução de alimentos, cobrando o que havia sido definido anteriormente, na separação.

O pai, à época, alegou que a obrigação acertada por ocasião do divórcio vinha sendo paga regularmente, mas o juiz da execução entendeu que aquele acordo dizia respeito apenas aos três filhos mais novos, pois a filha mais velha nem sequer havia sido mencionada na segunda ação.

O pai então, sob pena de prisão, recorreu ao Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJ/MG), que afirmou que o acordo celebrado pelo casal na ação de divórcio não substitui a obrigação de pensão à filha maior.

No habeas corpus apresentado ao Superior Tribunal de Justiça (STJ), o pai alegou que a exequente é maior de idade e pode arcar com seu próprio sustento. Disse também não ter capacidade financeira de pagar o débito e acrescentou que, se fosse preso, os outros filhos ficariam na miséria.

Para o relator, ministro Moura Ribeiro, não havendo essa prova pré-constituída, e como o habeas corpus não admite produção de provas, a questão deve ser analisada em ação própria, “em que se admite o amplo exercício do contraditório e da ampla defesa”.

O simples fato de a exequente ser maior de idade e possuir, em tese, capacidade de promover o próprio sustento não é suficiente para a concessão da ordem, considerando a inexistência de prova pré-constituída de que ela não necessita dos alimentos ou de que tem condições de prover a própria subsistência sem a prestação alimentar“, afirmou.

Outro ponto destacado pelo ministro é que, conforme a Súmula 358 do STJ, o cancelamento da pensão alimentícia de filho que atingiu a maioridade está sujeito a decisão judicial, mediante contraditório.

Especialista aprova decisão

Presidente do Instituto Brasileiro de Família (IBDFAM), seção Mato Grosso do Sul, Líbera Copetti afirma que a decisão é acertada, uma vez que caberia ao genitor a desconstituição da obrigação alimentar por meio de ação própria de exoneração de alimentos nos exatos termos da Súmula 358 do STJ.

“Eis que, diante da eficácia dos direitos fundamentais, o direito ao recebimento aos alimentos está consolidado atualmente na solidariedade familiar, mantendo-se a presunção de necessidade em casos de maioridade, cabendo o ônus da prova ao genitor devedor dos alimentos a fim de eximir-se da respectiva obrigação”, afirma.

Para ela, o advento da maioridade, apesar de extinguir o poder familiar, não revoga automaticamente o dever de prestar alimentos, que passam a ser devidos por efeito da relação de parentesco, decorrente da solidariedade familiar.

“Ou seja, apesar da necessidade alimentar não ser presumida em tais situações, como ocorre em relação aos filhos sob o poder familiar, pela própria natureza protetiva e de caráter subsistencial dos alimentos e da relação de parentalidade existente, a Súmula 358 do STJ mantém a presunção de necessidade garantindo dentro do contraditório a proteção à parte vulnerável, não vinculando estritamente a pensão alimentícia ao dever alimentar decorrente do poder familiar”, destaca.

Perda de passaporte e CNH

Sobre os novos procedimentos judiciais acerca dos processos de dívidas alimentícias, como a perda de passaporte e da Carteira Nacional de Habilitação (CNH) dos devedores, a advogada diz ser favorável desde que sejam utilizados de forma excepcional.

Ou seja, esgotadas as demais possibilidades coercitivas expressamente previstas na norma cogente, tais como protesto, inclusão em cadastros de inadimplentes entre outros, garantindo-se amplamente o contraditório, especialmente porque deve-se buscar a forma de execução menos gravosa em favor do devedor e porque tais procedimentos não estão contemplados expressamente na Lei.

“No entanto ao meu ver, não há como se cogitar a utilização de tais procedimentos se o trabalho desenvolvido pelo devedor depender, por exemplo, de sua Carteira Nacional de Habilitação (CNH), eis que fere diretamente a dignidade humana e o direito ao exercício de sua atividade laboral”, ressalta.

Enunciado 32

O Instituto Brasileiro de Família (IBDFAM) aprovou no XII Congresso Brasileiro de Direito das Famílias e Sucessões o Enunciado 32, que diz: É possível a cobrança de alimentos, tanto pelo rito da prisão como pelo da expropriação, no mesmo procedimento, quer se trate de cumprimento de sentença ou de execução autônoma.

Para Líbera Copetti, tal entendimento visa garantir maior efetividade e celeridade em tais processos, possibilitando no mesmo procedimento a efetivação concreta da demanda, assim como a proteção ao interesse da pessoa vulnerável.

“Não obstante isto, visa reduzir a quantidade de ações que estão em curso e que sobrecarregam o judiciário, facilitando o próprio acesso à justiça, tendo em vista que, apesar de avanços legais em relação a cobrança de débitos alimentares introduzidas pelo Código de Processo Civil, o que se verifica na prática é ainda é um longo calvário para recebimento de débitos alimentares. Inclusive, o Tribunal de Justiça do Amazonas (TJ/AM) fixou, recentemente, de forma inovadora, precedente possibilitando a cumulação no mesmo procedimento, a exemplo do enunciado aprovado pelo Instituto Brasileiro de Família (IBDFAM)”, finaliza.

Fonte: IBDFAM https://ibdfam.org.br/noticias/7123/Maioridade+civil+n%C3%A3o+desconstitui,+por+si+s%C3%B3,+obriga%C3%A7%C3%A3o+alimentar,+diz+STJ

O número do processo não foi divulgado em razão de correr em segredo de justiça.

Data da decisão: 04/12/2019

Sobre o autor

Camila Guerra

Camila Guerra

Advogada inscrita na Subseção de Santa Catarina da Ordem dos Advogados do Brasil sob o n. 40.377. Advogada sócia-proprietária do Escritório Guerra Advocacia, inscrito na OAB/SC sob o n. 5.571. Graduação em Direito na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Graduação em Administração Empresarial na Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC). Participação em Programa de Cooperação Internacional na Business School, Amiens (Ecole Supérieure de Commerce Amiens, Picardie, France). Pós Graduação em Direito Constitucional pela Universidade Anhanguera - Rede LFG. Especialização em Direito de Família e Sucessões pelo Instituto Brasileiro de Direito de Família - IBDFAM. Mentoria Avançada em Planejamento Sucessório e Prática da Constituição de Holding Patrimonial - Direito em Prática.  Associada ao Instituto Brasileiro de Direito de Família - IBDFAM.

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