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STJ: direito real de habitação não cabe em caso de divórcio

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que o direito real de habitação pode ser aplicado somente no caso de falecimento de um dos cônjuges, e não nos casos de divórcio.

Com esse entendimento, o colegiado negou recurso interposto em ação de divórcio cumulada com partilha de bens. A autora pleiteava a aplicação do direito real de habitação em imóvel onde residia com a filha e que tinha servido de residência da família na época em que estava casada.

No recurso, a mulher alegou intempestividade da contestação do ex-marido, sob o fundamento de que, após a entrada em vigor do atual Código de Processo Civil (CPC), de 2015, o termo inicial do prazo de resposta do réu teria sido alterado.

A relatora do caso, a ministra Nancy Andrighi, refutou a argumentação da parte recorrente de que, ao contrário do que dispunha o Código de Processo Civil (CPC) de 1973, a nova legislação processual civil teria modificado o termo inicial de contagem do prazo de contestação para o mesmo dia em que fosse juntado aos autos o mandado de citação cumprido.

Andrighi explicou que o dia do começo do prazo é excluído da contagem, o que significa que o prazo processual continua a ser contado a partir do dia útil seguinte.

“Nem sequer por interpretação literal do disposto no Código de Processo Civil (CPC) seria possível extrair o argumento alegado, pois o termo inicial do prazo e o início de sua contagem não se confundem”, esclareceu.

Direito de moradia

Confirmando a decisão proferida pelo tribunal de segundo grau, a ministra afirmou que o direito real de habitação não se aplica em caso de divórcio.

O direito real de habitação assegura a uma pessoa que ela possa morar em uma determinada casa ou apartamento durante toda sua vida, mesmo que não seja dona do imóvel.

Nancy Andrighi explicou que o instituto tem por finalidade preservar o direito de moradia ao cônjuge sobrevivente, nos casos em que o imóvel seja a única propriedade residencial da herança.

Apontando a ausência de posicionamento da doutrina acerca da possibilidade de aplicação do instituto típico do Direito Sucessório ao Direito das Famílias, a relatora afirmou que a questão deve ser resolvida na partilha de bens do divórcio.

De acordo com a ministra, o fato de a recorrente e sua filha permanecerem morando no imóvel que antes serviu de residência para o casal “não é suficiente para que se cogite aplicar, analogicamente, o instituto do direito real de habitação”.

Previsão está no Código Civil

A advogada Ana Carolina Tedoldi, membro do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM), explica que o direito real de habitação não é aplicável em caso de divórcio porque não diz respeito ao Direito das Famílias, somente ao Direito Sucessório.

“Esse instituto está previsto no artigo 1.831, do Código Civil, que diz: ‘Ao cônjuge sobrevivente, qualquer que seja o regime de bens, será assegurado, sem prejuízo da participação que lhe caiba na herança, o direito real de habitação relativamente ao imóvel destinado à residência da família, desde que seja o único daquela natureza a inventariar’”, explica.

Ela acredita que tal previsão seja importante para os casos de divórcio ou dissolução de união estável que apresentam particularidades.

“No caso de um cônjuge ou companheiro que se dedicou à casa, à família e aos filhos, e que, ao final do relacionamento, não possui condições financeiras ou qualificação profissional, ele deve ter o direito de continuar residindo no imóvel da família por um período, até que consiga reconstruir sua vida financeira”, afirma.

A especialista defende que o tema deva ser incluído numa revisão sobre o assunto na reforma do Código Civil, cujo anteprojeto, elaborado por uma comissão de juristas que inclui membros do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM), foi entregue ao Senado Federal em abril passado.

No contexto da partilha de bens em divórcios, Ana Carolina Tedoldi explica que há maneiras de assegurar o direito de moradia ao cônjuge que não possui propriedade sobre o imóvel residencial.

“A depender do regime de bens adotado pelo casal, poderá haver a partilha dos bens comuns, ou seja, que foram adquiridos onerosamente na constância do casamento. A partir daí, o casal pode chegar a um acordo em que determinado imóvel fique 100% para um deles, pagando o excesso de partilha. Outra alternativa pode ser tomada ainda durante o casamento, quando pode ser instituído o direito real de habitação convencional ou voluntário, instituído por meio de escritura pública levada a registro na matrícula imobiliária. Sendo assim, mesmo que o imóvel seja de propriedade do cônjuge, o outro terá direito real de habitação sobre ele, uma vez que convencionaram por meio de instrumento adequado”, avalia.

Fonte: IBDFAM https://ibdfam.org.br/noticias/12113/STJ%3A+direito+real+de+habita%C3%A7%C3%A3o+n%C3%A3o+cabe+em+caso+de+div%C3%B3rcio

Data: 14/08/2024

Sobre o autor

Camila Guerra

Camila Guerra

Advogada inscrita na Subseção de Santa Catarina da Ordem dos Advogados do Brasil sob o n. 40.377. Advogada sócia-proprietária do Escritório Guerra Advocacia, inscrito na OAB/SC sob o n. 5.571. Graduação em Direito na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Graduação em Administração Empresarial na Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC). Participação em Programa de Cooperação Internacional na Business School, Amiens (Ecole Supérieure de Commerce Amiens, Picardie, France). Pós Graduação em Direito Constitucional pela Universidade Anhanguera - Rede LFG. Especialização em Direito de Família e Sucessões pelo Instituto Brasileiro de Direito de Família - IBDFAM. Mentoria Avançada em Planejamento Sucessório e Prática da Constituição de Holding Patrimonial - Direito em Prática.  Associada ao Instituto Brasileiro de Direito de Família - IBDFAM.

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