Advocacia Guerra

Mães garantem na Justiça de Mato Grosso direito de registrar com dupla maternidade filho fruto de inseminação caseira

Duas mães conseguiram na Justiça de Mato Grosso o direito de registrar o filho junto ao cartório com o nome das requerentes, sem distinção de ascendência paterna ou materna. Vivendo em união estável desde 2019, o casal optou por gerar a criança por meio de inseminação caseira. A decisão é da 4ª Vara de Família e Sucessões de Cuiabá.

Na ação declaratória de maternidade socioafetiva e registro de parentalidade homoafetiva com pedido de tutela antecipada do nascituro, as autoras afirmaram que os altos valores cobrados para a inseminação artificial as fizeram desistir do procedimento. Elas então tomaram conhecimento de que muitos casais homoafetivos têm realizado inseminação caseira, em face do baixo custo de sua realização.

O casal encontrou, então, uma pessoa de confiança que se prontificou a fazer a doação do material genético, assumindo o compromisso do anonimato. O sucesso veio na primeira tentativa de fecundação. Juntas, elas vivenciaram o desenvolvimento do bebê e cada etapa de uma gravidez compartilhada.

Por não ter sido realizado procedimento de reprodução assistida formal, em clínica especializada, não há previsão legal que autorize o registro materno com as interessadas, somente para aquela que, efetivamente, gere o nascituro. Por isso, elas pediram autorização para registrar a criança com o nome de ambas como ascendentes.

Maternidade conjunta

“No caso dos autos, constata-se que inexiste entre as partes qualquer pretensão resistida, uma vez que estão em comum acordo em relação à intenção de assumirem a maternidade conjuntamente”, destacou o juiz Gilperes Fernandes da Silva ao deferir o pedido de tutela de urgência, de acordo com regramento do Código de Processo Civil (Lei 13.105/2015).

Como a ação também postula a declaração de maternidade socioafetiva, o juiz também acolheu o parecer ministerial para determinar a realização de um estudo social, com a oitiva das partes e de vizinhos, se possível, a fim de constatar os fatos alegados e verificar, in loco, a situação noticiada.

O magistrado destacou a necessidade de atender o interesse superior do nascituro, princípio consagrado pelo Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA (Lei 8.069/1990). Ele observou ainda que o artigo 1.593 do Código Civil possibilita que a relação biológica e socioafetiva serem reconhecidas conjuntamente: “O parentesco é natural ou civil, conforme resulte de consanguinidade ou outra origem”.

“A realidade é que as mães possuem as condições e interesse em criar essa criança que nascerá, de modo que a melhor medida para garantir a fiel representatividade dos fatos é o registro de nascimento em nome de ambas, a fim de conferir o reconhecimento jurídico do status de filho das requerentes.”

Leia a íntegra da decisão no Banco de Jurisprudência do IBDFAM (acesso exclusivo para associados).

Direito de Família é dinâmico, aponta advogada

A advogada Flavia Arruda de Oliveira, membro do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM, atuou no caso. “A concessão do pedido em sede de tutela antecipada foi acertada e demonstra a preocupação do Poder Judiciário do Estado de Mato Grosso com o melhor interesse da criança”, defende.

“O Direito de Família é dinâmico e evolui com a rapidez da evolução das relações afetivas. Não restam dúvidas de que, para o Direito moderno, o direito à filiação é construído pela convivência, pela constância da relação entre pai e filho, sendo que mãe e pai afetivo é aquele que ocupa, na prática, o papel exercido pelos pais biológicos.”

Segundo Flavia, no caso em análise, a gravidez da requerente representa, inegavelmente, a ampliação de uma família homoafetiva já existente. “Negar o direito ao infante de ter seu registro de nascimento com o nome da mãe biológica e da mãe socioafetiva, pelo fato de se estar diante de uma inseminação artificial caseira, seria desrespeitar o princípio basilar da dignidade humana.”

“Assim, a decisão referida é merecedora de aplausos e que seja exemplo a ser pacificado em todos os Tribunais do país”, conclui a advogada.

Processo 1002785-40.2022.8.11.0041

Fonte: IBDFAM https://ibdfam.org.br/noticias/9358/M%C3%A3es+garantem+na+Justi%C3%A7a+de+Mato+Grosso+direito+de+registrar+com+dupla+maternidade+filho+fruto+de+insemina%C3%A7%C3%A3o+caseira

Decisão: 15/02/2022

Sobre o autor

Camila Guerra

Camila Guerra

Advogada inscrita na Subseção de Santa Catarina da Ordem dos Advogados do Brasil sob o n. 40.377. Advogada sócia-proprietária do Escritório Guerra Advocacia, inscrito na OAB/SC sob o n. 5.571. Graduação em Direito na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Graduação em Administração Empresarial na Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC). Participação em Programa de Cooperação Internacional na Business School, Amiens (Ecole Supérieure de Commerce Amiens, Picardie, France). Pós Graduação em Direito Constitucional pela Universidade Anhanguera - Rede LFG. Especialização em Direito de Família e Sucessões pelo Instituto Brasileiro de Direito de Família - IBDFAM. Mentoria Avançada em Planejamento Sucessório e Prática da Constituição de Holding Patrimonial - Direito em Prática.  Associada ao Instituto Brasileiro de Direito de Família - IBDFAM.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado.

Rolar para cima