Um laudo, feito por peritos brasileiros, não considerou informações produzidas no exterior e justifica a permanência no país de uma criança nascida nos Estados Unidos e trazida ao Brasil pela mãe. Assim entendeu, por maioria de votos, a 1ª Turma do Superior Tribunal de Justiça – STJ.
A criança nasceu em 2009, nos Estados Unidos, fruto do relacionamento entre uma brasileira e um americano. Conforme consta nos autos, em julho de 2013, a mãe viajou para o Brasil para uma comemoração, com autorização do genitor.
Na época da viagem, o casal já havia se divorciado e compartilhava a guarda. A mulher, porém, decidiu não voltar para os Estados Unidos, sem avisar o pai da criança. Três meses depois, o pai ajuizou ação para pedir o retorno do filho.
Interpretação extensiva
A Justiça brasileira conferiu interpretação extensiva ao texto da Convenção de Haia sobre sequestro internacional de crianças. De acordo com o artigo 12 da Convenção, a autoridade brasileira deveria ordenar o retorno imediato, pois o processo foi proposto menos de um ano após a transferência ilícita do infante.
O artigo 13, porém, aborda exceções, como a hipótese de existir risco grave de a criança, “no seu retorno, ficar sujeita a perigos de ordem física ou psíquica, ou, de qualquer outro modo, ficar numa situação intolerável”.
Ainda conforme o texto, ao apreciar as exceções, a autoridade responsável deve levar em consideração informações relativas à situação social da criança, fornecidas pela autoridade central ou por qualquer outra autoridade competente do Estado de residência habitual da criança.
Desenvolvimento psicoemocional
A ação proposta pelo genitor, nos Estados Unidos, reúne evidências da plena condição de exercício da paternidade. O material inclui análise de assistentes sociais, perícia psicológica e testemunho, por exemplo, da babá da criança.
O laudo produzido por peritos da Justiça Federal brasileira, porém, concluiu que o retorno da criança não traria meras inconveniências, mas grave risco ao desenvolvimento psicoemocional por causa da conturbada dinâmica familiar. O documento menciona conflitos entre os pais, com acusações de violência doméstica e alcoolismo.
A sentença de primeiro grau, que manteve a criança no Brasil, teve como base apenas o laudo brasileiro. O Tribunal Regional Federal da 1ª Região e o STJ confirmaram o entendimento
Divergências
A ministra Regina Helena, em voto-vista divergente, destacou que o Judiciário brasileiro ignorou as informações fornecidas pelas autoridades americanas. Para ela, a conclusão fere diretamente a Convenção de Haia.
“Em que pese a imputação de enfermidade psiquiátrica do pai pela mãe, há nos autos elementos em sentido oposto, afirmando a plena condição de ele exercer guarda da criança com zelo. O acórdão, ao se basear no laudo pericial feito por determinação do juízo brasileiro, foi omisso quanto a esses documentos”, pontuou a magistrada.
No entendimento da ministra, o caso deveria retornar ao TRF-1 para reanálise da apelação, com respeito ao texto do artigo 13 da Convenção de Haia.
Venceu o voto do relator, ministro Benedito Gonçalves. O ministro concluiu que “a fundamentação adotada no tribunal de origem para manter o menor no Brasil está lastreada em minucioso laudo psicológico”.
REsp 1.842.083
Fonte: https://ibdfam.org.br/noticias/10161/Laudo+brasileiro%2C+que+n%C3%A3o+considerou+informa%C3%A7%C3%B5es+produzidas+no+exterior%2C+justifica+a+perman%C3%AAncia+de+crian%C3%A7a+no+pa%C3%ADs
Decisão: 20/10/2022