Uma ação declaratória de alienação parental com regulamentação de convivência familiar deve ser apreciada pelo Juízo da Vara de Família da Comarca de Florianópolis, mesmo após mudança de mãe e filho para Porto Alegre. A decisão unânime da 1ª Câmara de Direito Civil do Tribunal de Justiça de Santa Catarina – TJSC considerou as particularidades do caso, já que, em situações assim, a competência costuma ser da comarca em que reside a criança.
De acordo com os autos, o pai protocolou ação, em 2017, na Comarca de Mafra, no interior de Santa Catarina. Ele alegava não saber qual o local de residência da criança e da genitora, que tem a guarda de fato. Em setembro de 2020, ainda não localizada a ré, o autor requereu que fossem os autos remetidos ao foro do seu novo domicílio, na Comarca de Santo Amaro da Imperatriz, pleito este acolhido.
Em manifestação espontânea, na ocasião, a mãe informou residir com o filho em Florianópolis. Por isso, o magistrado responsável pelo caso declinou da competência para o foro da Comarca da Capital e, desde então, neste tramitava o processo desde outubro de 2020. Posteriormente, a mulher noticiou que passara a morar em Porto Alegre, no Rio Grande do Sul.
Com a nova informação, o Juízo da Vara da Família da Comarca de Florianópolis declinou da competência e determinou a remessa dos autos à comarca em que residem mãe e filho, no outro estado. É o que determina o artigo 147 do Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA, assim como a Súmula 383 do Superior Tribunal de Justiça – STJ.
Procedimento especial para proteger a criança
Os dispositivos foram considerados pelo desembargador Gerson Cherem II, que ponderou: “O objetivo é preservar ao máximo o interesse da criança ou adolescente, facilitando os meios para que ela exerça seu direito de ação ou de defesa”. No caso dos autos, contudo, “observa-se que a guarda, ao menos de fato, está com a genitora, restando viável, primo ictu oculi, fixar-se a competência de acordo com o local de residência desta”.
De acordo com o desembargador, o caso traz “peculiaridades a autorizar intelecção diversa”. Ele citou, no voto, que a Lei da Alienação Parental (12.318/2010), em seu artigo 8º, disciplina: “A alteração de domicílio da criança ou adolescente é irrelevante para a determinação da competência relacionada às ações fundadas em direito de convivência familiar, salvo se decorrente de consenso entre os genitores ou de decisão judicial”.
Cherem também entendeu que, com a constante alteração de domicílio do filho, “faz-se necessário observar-se o procedimento especial, previsto na supramencionada lei”. Ele acrescentou: “Nesse pensar, passados mais de quatro anos do ajuizamento da demanda, o recorrente permanecia sem ter ciência do completo endereço de seu filho, sendo que esta seria a quarta alteração de foro”.
Regras não podem ser aplicadas de forma automática, diz advogada
A advogada Mariane Bosa, membro do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM, atuou no caso representando o pai. “A decisão é de extrema relevância para o combate à alienação parental e enaltece a doutrina da proteção Integral e o melhor interesse da criança e do adolescente”, comenta.
Ela frisa que o caso evidencia o valor da Lei da Alienação Parental. “A decisão ressalta a importância da manutenção da Lei 12.318/2010 ao aplicar o seu artigo 8º e não determinar a declinação da competência mesmo após nova alteração de endereço da genitora”, observa Mariane.
“Manter a competência na comarca da residência antiga do infante, mesmo após nova mudança da genitora, apresenta medida que atende o melhor interesse da criança. Eis o juízo em que já está sendo realizada a instrução processual possui mais condições para verificar os fatos e decidir sobre a controvérsia”, destaca.
Da mesma forma, de acordo com a advogada, não se prejudica a celeridade processual que casos dessa natureza requerem. “A decisão, portanto, reforça a doutrina da proteção integral, em não aplicar de forma automática as regras processuais se elas causarem prejuízos à criança e ao adolescente, priorizando assim o melhor interesse desses sujeitos de direitos em desenvolvimento”, conclui Mariane Bosa.
Decisão: 30/09/2021