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Imóvel único adquirido no curso da execução pode ser considerado bem de família impenhorável, decide STJ

Em decisão recente, a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) confirmou acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ/SP) que proibiu a penhora do único imóvel de devedores com comprovada residência no local, mesmo tendo sido adquirido no curso da execução, por considerá-lo bem de família legal. Entendimento é de que o imóvel adquirido no curso da demanda executiva pode ser considerado bem de família, para fins de impenhorabilidade.

No caso dos autos, o credor sustentou a impossibilidade de reconhecimento da impenhorabilidade do imóvel, pois o bem teria sido adquirido depois de proferida decisão judicial que declarou o executado devedor. Apontou que o bem de família foi instituído por ato de vontade do executado e, portanto, a impenhorabilidade sobre o imóvel é limitada, valendo, tão somente, em relação a dívidas futuras, posteriores à instituição convencional.

O ministro Luis Felipe Salomão, relator do caso, explicou que o bem de família voluntário ou convencional é aquele cuja destinação decorre da vontade do seu instituidor, visando a proteção do patrimônio em relação à satisfação forçada das dívidas do devedor proprietário do bem. “O Código Civil confere ao titular da propriedade a possibilidade de escolha do bem eleito, colocando como condição de validade apenas a circunstância de que o bem escolhido não tenha valor que ultrapasse um terço do patrimônio líquido existente no momento da afetação.”

Legitimidade da escolha

O magistrado destacou que, conforme a  jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ), a legitimidade da escolha do bem destinado à proteção da Lei 8.009/1990, feita com preferência pela família, deve ser confrontada com o restante do patrimônio existente, sobretudo quando este, de um lado, se mostra incapaz de satisfazer eventual dívida do devedor, mas de outro atende perfeitamente às necessidades de manutenção e sobrevivência do organismo familiar (STJ, REsp 831.811).

Luis Felipe Salomão também pontuou a distinção entre o bem de família voluntário e o regime legal: “o bem de família convencional deve ser instituído por escritura pública ou testamento, devidamente registrados no Cartório de Registro de Imóveis; o bem de família legal ou involuntário institui-se automaticamente, bastando a propriedade do bem e sua utilização como residência”.

Segundo o ministro, no caso analisado, “só o fato de ser o imóvel residencial bem único do recorrido, sobre ele, necessariamente, incidirão as normas da Lei 8.009/1990, mormente a impenhorabilidade questionada pelo exequente”. Para ele, ainda que se tratasse, nos termos alegados pelo recorrente, de imóvel voluntariamente instituído como bem de família, considerando que se trata de único bem imóvel do executado, a proteção conferida pela lei subsistiria, de maneira coincidente e simultânea, e, nessa extensão, seria capaz de preservar o bem da penhora de dívidas constituídas anteriormente à instituição voluntária.

A proteção, de acordo com o relator, vem do regime legal e não do regime convencional. “No caso que se analisa, o imóvel adquirido pelo executado apenas não receberia a proteção da Lei 8.009/1990 caso o devedor possuísse outro imóvel, de valor inferior e nele também residisse.”

Salomão completou que, por se tratar de dívidas anteriores à hipotética instituição convencional, seria permitida a penhora do imóvel residencial de maior valor, mas o imóvel residencial de menor valor seria resguardado, incidindo sobre ele as normas protetivas da Lei 8.009/1990. Registrou ainda não haver indícios de que a aquisição do imóvel tenha caracterizado fraude à execução.

“Sendo assim, no caso em exame, a partir do delineamento fático posto pelo acórdão, tenho que fora adequadamente aplicado o direito, devendo ser mantida a decisão de impenhorabilidade do bem”, concluiu o magistrado.

Fonte: IBDFAM https://ibdfam.org.br/noticias/9330/Im%C3%B3vel+%C3%BAnico+adquirido+no+curso+da+execu%C3%A7%C3%A3o+pode+ser+considerado+bem+de+fam%C3%ADlia+impenhor%C3%A1vel%2C+decide+STJ

STJ, REsp 1.792.265

Decisão: 07/02/2022

Sobre o autor

Camila Guerra

Camila Guerra

Advogada inscrita na Subseção de Santa Catarina da Ordem dos Advogados do Brasil sob o n. 40.377. Advogada sócia-proprietária do Escritório Guerra Advocacia, inscrito na OAB/SC sob o n. 5.571. Graduação em Direito na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Graduação em Administração Empresarial na Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC). Participação em Programa de Cooperação Internacional na Business School, Amiens (Ecole Supérieure de Commerce Amiens, Picardie, France). Pós Graduação em Direito Constitucional pela Universidade Anhanguera - Rede LFG. Especialização em Direito de Família e Sucessões pelo Instituto Brasileiro de Direito de Família - IBDFAM. Mentoria Avançada em Planejamento Sucessório e Prática da Constituição de Holding Patrimonial - Direito em Prática.  Associada ao Instituto Brasileiro de Direito de Família - IBDFAM.

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