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Não é possível doação entre cônjuges casados em regime de comunhão universal de bens

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu pela impossibilidade de doação entre cônjuges casados em regime de comunhão universal de bens. O colegiado entendeu que, nessa hipótese, o produto da doação passaria a ser novamente bem comum do casal, visto que, em tal regime, tudo o que é adquirido se comunica.

No caso analisado pela turma, a esposa cedeu cotas de uma empresa para o marido. Após a morte dela, seu irmão ajuizou ação para anular a doação.

O irmão afirmou que a doação teve o objetivo de prejudicar a mãe deles, herdeira necessária – também falecida. Asseverou que a irmã foi casada no regime de comunhão universal de bens, de modo que a doação de patrimônio para o marido não teria qualquer eficácia, porque todo o acervo patrimonial pertence a ambos os cônjuges.

Na sentença, o pedido foi julgado improcedente. A decisão foi mantida na segunda instância, sob o fundamento de não haver impedimento legal à doação entre cônjuges. O tribunal entendeu também que não era aplicável ao caso o instituto que veda ao cônjuge dispor de parte de seu patrimônio sem respeitar o direito da legítima.

Além disso, a corte local registrou que a doação é um negócio jurídico realizado em vida por pessoa maior e capaz de dispor acerca de seu patrimônio.

Impossibilidade jurídica

A relatora do processo, ministra Nancy Andrighi, lembrou que, conforme o Código Civil de 1916 – aplicável ao caso porque o casamento, a doação e a morte do cônjuge ocorreram na sua vigência –, o regime de comunhão universal implica a comunicação de todos os bens dos cônjuges, presentes e futuros, e suas dívidas passivas, ressalvada a incomunicabilidade dos bens mencionados expressamente pelo próprio código.

De acordo com a ministra, como se trata de regime no qual os cônjuges detêm a copropriedade do patrimônio que possuíam antes e que adquiriram na constância do casamento, “salta aos olhos a manifesta impossibilidade de que haja doação entre cônjuges casados sob esse regime”.

Nancy Andrighi ressaltou que, embora a matéria não tenha sido amplamente debatida no STJ, há precedente antigo da Segunda Seção exatamente no sentido de que a doação entre cônjuges no regime de comunhão universal de bens é nula, por impossibilidade jurídica do seu objeto.

Se a doação fosse feita, comentou a relatora, o bem doado retornaria novamente ao patrimônio comum do casal.

Direito da leg​ítima

Quanto à afirmação de desrespeito à legítima de herdeiro necessário, a ministra acolheu a alegação e salientou que a redação do CC/1916 previa que a existência de descendentes ou de ascendentes excluía o cônjuge sobrevivente da ordem da vocação hereditária, ressalvando-se em relação a ele, entretanto, a sua meação, a qual independe do direito de herança.

“Assim, na dissolução do casamento sob o regime da comunhão universal de bens, deve ser reservada a meação do cônjuge sobrevivente e deferida aos herdeiros necessários a outra metade”, declarou Nancy Andrighi.

Dessa forma, destacou a magistrada, como a mãe da doadora das cotas estava viva ao tempo de sua morte, passou a ter direito – como herdeira necessária ascendente – à metade dos bens deixados por sua descendente, restando ao marido apenas a meação dos bens.

Fonte: STJ https://www.stj.jus.br/sites/portalp/Paginas/Comunicacao/Noticias/08072020-Nao-e-possivel-doacao-entre-conjuges-casados-em-regime-de-comunhao-universal-de-bens-.aspx

Autos: REsp 1787027

Data da decisão: 08/07/2020

Sobre o autor

Camila Guerra

Camila Guerra

Advogada inscrita na Subseção de Santa Catarina da Ordem dos Advogados do Brasil sob o n. 40.377. Advogada sócia-proprietária do Escritório Guerra Advocacia, inscrito na OAB/SC sob o n. 5.571. Graduação em Direito na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Graduação em Administração Empresarial na Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC). Participação em Programa de Cooperação Internacional na Business School, Amiens (Ecole Supérieure de Commerce Amiens, Picardie, France). Pós Graduação em Direito Constitucional pela Universidade Anhanguera - Rede LFG. Especialização em Direito de Família e Sucessões pelo Instituto Brasileiro de Direito de Família - IBDFAM. Mentoria Avançada em Planejamento Sucessório e Prática da Constituição de Holding Patrimonial - Direito em Prática.  Associada ao Instituto Brasileiro de Direito de Família - IBDFAM.

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